18.1.06

criação de necessidades

Ao observar o comportamento de alguns arrumadores, lembro-me com frequência daquelas organizações que cobram coercivamente dinheiro às pessoas para protecção.
A lógica é similar, pois embora o serviço prestado seja a priori desprovido de valor, a sua utilidade objectiva é facilmente comprovável: se o «cliente» não pagar, aquilo que o serviço pretende evitar pode efectivamente acontecer.

Em termos abstractos, são dois exemplos drásticos de criação de necessidades: o consumidor não só não as sente como efectivamente não as tem (razão pela qual não se pode falar em detecção de necessidades), mas acaba por adquirir o serviço pois a tal é de alguma forma coagido.

Nas sociedades de consumo de hoje, a fronteira entre as necessidades que se detecta e as que se inventa é no mínimo ténue. A coacção que leva o indivíduo a comprar não é física, é social e emocional.

Quais as necessidades preenchidas numa criança ao receber dez bonecas em vez de uma só pelo Natal? Ou num adulto que se endivida bem para além das suas capacidades para comprar bens de luxo?

Os cidadãos das sociedades actuais são de certa forma equiparáveis aos guerrilheiros que temem o fim da guerra: reconhecem que a situação actual não é sustentável mas recusam por-lhe travão pois duvidam do seu enquadramento numa nova ordem social.