28.12.05

oh, la politique!

Em que outra actividade o profissionalismo é um insulto, ter ideias é pecado, assumir uma posição um erro?

23.12.05

lar

Olhos fixos no monitor mas ouvidos presos nas costas,
deixo o dia passar sem controlo ou intervenção e
aproveito as sempre parcas gotas da poção mágica que,
sem mais, transforma o negro em rosa idílico.

As letras juntadas em esforço estético pouco dizem
do que capturo nos cheiros e sons que me rondam,
enquanto extasiado me imponho carregar nas teclas
e evitar que um riso sequer se perca em mim.

Como personagem que sou neste quadro, deixo ao artista
as pinceladas de cada gesto, afasto-me e observo,
actor e público num só, num prazer contido para não
perturbar a cadência da peça e as falas dos colegas.

Ao redor a acção desenrola-se, ausente destas reflexões,
movida por motivações que estranho, mas agarra-me
como se eu tivesse podido, em algum momento,
contribuir para a escolha do caminho que tomou.

Neste misto de realidade ficcionada e sonho concretizado,
confundo visto e imaginado, deliciado por poder fazê-lo,
frustrado pela antecipação das saudades deste agora,
realizado pela certeza de uma vida desde já gloriosa.

22.12.05

delírio cinéfilo

Em A Few Good Men (Uma Questão de Honra), o Lt. Daniel Kaffee (Tom Cruise) interroga o Col. Nathan R. Jessep (Jack Nicholson) de forma extremamente agressiva, para tentar obter uma confissão.
Num clima de enorme tensão, arrisca a punição e pergunta, em tom assumidamente acusatório:
- Did you order the code red?
Ao que responde Jessep:
- You're goddamn right I did!

Parece-me que isto não andará longe do que Soares procurou no debate com Cavaco:
- Vai provocar uma crise política?
- Bem, eu pensava que era desta que íamos ouvir falar das ideias do Dr. Soares, mas posso continuar a falar das minhas. [aqui carrega no play da k7] bla-bla-bla desemprego bla-bla-bla desenvolvimento bla-bla-bla formação...

21.12.05

Soares

não liga a sondagens de opinião.

Considera mais fiável o que lhe dizem os amigos em Bruxelas e o que lhe transmitem as vibrações das gentes quando anda pelo país.

diz-se

que Soares é o mais confortável perante as cameras.

Mas Cavaco é o melhor actor.

20.12.05

hoje

passei a admirar José Sócrates.

A combinação com Cavaco pode ser magnífíca ou terrível, mas nunca menos do que isso.

15.12.05

Arnold Schwarzenegger

é mesmo o Exterminador Implacável.

Recuperando um diálogo de T2:
- You can´t go around killing people!
- Why?

14.12.05

a partir

de certa altura na vida deixamos de avaliar as pessoas e os acontecimentos pelo que são, passamos a medi-los em função do que nos fazem lembrar.

E ficamos convencidos que essa é uma boa medida de análise, como se o facto de fulano nos recordar de sicrano os equivalesse em mais do que num breve instante de associação aleatória.

Em supremo paradoxo, sentenciamos de forma irreflectida o desconhecido com base no que temos por familiar.
Evitamos a todo o custo a dissonância cognitiva, fechando a mente a quaisquer hipóteses de contradição, de incoerência, de questionamento dos nossos preconceitos.

Porque estes são cómodos, permitem-nos habitar um mundo estático, com conceitos arrumados e imutáveis, num modelo explicativo com poucas variáveis independentes.

Vezes sem conta repito que o passado é a pior bitola de estimação do porvir, contudo tendo a fundamentar na experiência as decisões mais importantes, provavelmente por não possuir critério mais tranquilizante.

Confundo idade com sabedoria e, por sua vez, esta última com capacidade de antecipação. Ainda que estas causalidades sejam consecutivamente postas em causa, algo me impele a não as questionar.

Porventura nos agarramos à certeza do passado na esperança que este se repita?

13.12.05

intérpretes

à medida que o internetês, a língua global de inspiração anglo-saxónica, ocupasse os espaços dos idiomas tradicionais, imaginar-se-ia que as barreiras linguísticas se esbatessem com suprema naturalidade, elevando a comunicação a níveis inimagináveis.

Pelo menos é esse o raciocínio (como o entendo) que impele os defensores dos espaços virtuais comuns, da partilha de pensamentos, da troca de ideias, da globalização cultural e da generalização de conceitos: se comunicarmos mais, crescemos como um todo.

Sucede contudo uma falha que, intrínseca ao método de pesquisa que adoptámos, se afirma indiferente à estética e insuperável pelos meios, resumindo-se ao seguinte: o ser humano não quer ainda mais partilha.

Em contraponto com o empenho de alguns na redução de diferenças, todos apostam, a nível individual ou grupal (tribal), na diferenciação. Como um todo, rejeitamos a massificação e repudiamos a equivalência metafísica.

Só assim se explica a especialização, que conduz ao aprofundamento por vezes doentio de temáticas com relevância no mínimo questionável, e a consequente necessidade de interpretação.

Enquanto especialistas, deixamos de saber dirigirmo-nos àqueles que não o são, e procuramos quem possa traduzir o que dizemos.
Criamos portanto novas barreiras linguísticas, novas paredes na comunicação. Mas este fenómeno, embora contraproducente, enraizou-se.

8.12.05

futeboladas

O Liverpool de Rafa Benitez, goleado pelo Chelsea para o campeonato, não consentiu à equipa de Mourinho um só golo nos 4 jogos em que se defrontaram para a Liga dos Campeões.

A equipa de ontem do Benfica voltou a mostrar, exibição à parte, ser também ela talhada para competições a eliminar.
Não apenas por ter eliminado o Manchester Utd., mas por todo o comportamento nos jogos internacionais, adivinho complicações sérias para qualquer adversário do SLB na Liga dos Campeões.

Já quanto ao campeonato, o mais provável é um desempenho modesto, sobretudo tendo em conta a eliminação dos restantes clubes portugueses inicialmente envolvidos nas competições europeias.

ironias

neste momento, não gostar de Saramago é heresia.

Eu, herético, me confesso.

6.12.05

conspiração livresca

ou a angústia de quem procura livros cativantes na altura do Natal.

O novo livro de Saramago tomou de assalto as livrarias. Nas últimas que visitei, ocupa o primeiro lugar na lista dos mais vendidos.
Deixo aqui um exercício para os apreciadores de métodos quantitativos: qual a perpetuidade de um prémio Nobel da literatura usando como factor de desconto a taxa de juro sem risco?

A proliferação de obras situadas na zona de influência de O Código da Vinci é tal que sugiro o reconhecimento oficial do estilo Danbrownesco (Danbrownish).
E deixo uma sugestão temática para uma nova fábula: a influência do bicho papão na estratégia Nazi na década de 30.

Miguel Sousa Tavares reafirma-se como referência no panorama da escrita nacional ao assumir a internacionalização a grande escala e a projecção cinematográfica de Equador como objectivos e ao estender a sua área de influência à literatura infantil.
Para todos os efeitos, evidências de qualidades que poderão iconizá-lo.

Nota final para as biografias: imploro algum critério na edição, é deprimente ver as prateleiras forradas de histórias de personagens irrelevantes.

5.12.05

a economia

não está à margem das ideologias. Pelo contrário, está imersa em convicção, fé e tabus.

Cavaco aflorou a questão das políticas pró-cíclicas seguidas nos últimos anos, num tom de transparente antecipação do desinteresse de Alegre pelo tema e do corte de palavra a que viria efectivamente a ser sujeito.
Outro talvez não deixasse escapar e lembrasse tempos idos em que a economia carburava em pleno mas era continuamente alimentada pelo Estado.

Alegre tentou a gracinha na questão estrutural mas não conseguiu desenvolver e Cavaco habilmente deixou cair.

Já o referi em posts anteriores: Cavaco só pode ser afrontado se algum candidato o questionar justamente na área que toma por sua.
Aí ruiria a estratégia de «não me comprometo» e seria possível perceber para que lado do hemisfério pende a balança do candidato.

Stôr, como ganhar eleições sem soar keynesiano?

debates

Se todos forem como o de hoje, sugiro que as perguntas passem a ser escritas a priori num quadro, lidas pelo pivot do noticiário e respondidas à vez, por ordem definida aleatoriamente.

Algumas alternativas seriam a indicação de representantes/mandatários para ler as respostas, o envio dos textos para leitura pelo pivot e a publicação dos discursos (sim, foi disso que se tratou) num jornal de grande tiragem.

Cruéis tempos estes em que o poeta esconde a alma.

P.S.: estou curioso para saber que espaço a TVI vai reservar para estes pseudo-debates: será antes ou depois da queda na ladeira da D. Cidália em Arruda dos Vinhos?

Cavaco

parece uma criança de visita a uma loja de porcelanas com os pais: está cheio de vontade de partir a loiça toda mas imagina a reprovação e retrai-se...